domingo, 1 de junho de 2014

MUSICALIZAÇÃO INFANTIL: aprender cantando

A música é reconhecida por muitos pesquisadores como um importante instrumento, que auxilia no desenvolvimento da mente humana, contribui para o equilíbrio, proporciona uma incrível sensação de bem-estar, facilita a concentração e o desenvolvimento do raciocínio. Não é a toa, que muitos educadores utilizam a música como meio de um processo de aprendizagem. Ela une grupos, deixa o ambiente mais alegre, torna o aprendizado um momento divertido e uma grande brincadeira. Há quem garanta que crianças que desenvolvem trabalhos com música desde cedo apresentam melhor desempenho na escola e na vida como um todo. E esse reconhecimento da música não é de hoje. Já dizia Platão que " a música é um instrumento educacional mais potente do que qualquer outro". 

Aqui em casa a música é muito querida entre os meninos. Seja ouvindo um CD, seja cantarolando pela casa uma cantiga de roda, seja brincando com algum instrumento de brinquedo. Matheus este ano está especialmente empolgado com a música. Desde o início do ano está aprendendo a tocar flauta doce no colégio. A empolgação dele a cada nota musical tocada fica estampada em seu rosto. Rafael, que entrou no colégio este ano, está empolgadíssimo com a aulas de música. As segundas-feiras são dias especiais para o meu pequeno. Ele sempre sai com um comentário, fala da música nova que aprendeu e fica todo orgulhoso nos mostrando as técnicas corporais que sabe fazer. Ele descobriu que é super fã do Grupo Barbatuques, em que consiste em explorar os sons que podemos produzir ao bater palmas, pés, estalando os dedos ou qualquer ação que possa produzir sons. 


Matheus e a guitarra: música está 
presente nos jogos eletrônicos!


Por todos esses motivos, a musicalização infantil virou assunto aqui do blog. A seguir uma entrevista ping-pong com a arte educadora Elaine Othero de Souza, que há 10 anos trabalha com educação musical.  




O que é exatamente musicalização infantil? 
Musicalização é o processo de construção do conhecimento musical despertando e desenvolvendo o gosto pela música, estimulando e contribuindo para a formação integral do ser humano. A musicalização é desenvolvida através de atividades lúdicas, importante elemento motivador para o desenvolvimento da percepção musical, visando o aperfeiçoamento da percepção auditiva, coordenação motora, socialização, expressividade, percepção espacial, memorização e imaginação.


Quais os seus benefícios para as crianças? 
          A musicalização contribui com o desenvolvimento da sensibilidade, criatividade, noção espacial, senso rítmico, imaginação e a  auto-disciplina. Estudos científicos provam ainda que a musicalização estimula a memória, concentração e atenção.
O contato com a música também proporciona uma melhor convivência entre as crianças, propiciando uma comunicação mais harmoniosa, conferindo uma maior segurança emocional ao criar um ambiente de confiança, respeito mútuo, ajuda e colaboração.


De que forma a música pode contribuir para o desenvolvendo motor, psíquico e cognitivo das crianças? 
         A música é muito mais que um agrupamento de sons que compõem uma melodia. Ela tem efeitos consideráveis no ser humano conseguindo ao mesmo tempo acalmar um bebê ou dar coragem a um soldado para enfrentar grandes batalhas.
         O contato com a música estimula várias regiões de nosso cérebro.
As atividades de musicalização contribuem no desenvolvimento da criança permitindo que ela conheça melhor a si mesma, contribuindo como reforço no seu desenvolvimento cognitivo, linguístico, sócio afetivo e psicomotor. A criança vive um constante processo de construção de sua identidade, percebe-se diferente dos outros mas ao mesmo tempo procura integrar-se. As atividades musicais coletivas promovem a socialização estimulando a compreensão, participação e cooperação, levando a criança a desenvolver o conceito de grupo. A música também auxilia a criança a demonstrar seus sentimentos, liberando suas emoções construindo assim o sentimento de segurança e autoestima.
As experiências rítmicas  onde a criança tem uma participação ativa tocando um instrumento, ouvindo ou mesmo observando levam a um desenvolvimento efetivo dos seus sentidos aperfeiçoando sua acuidade auditiva, a coordenação motora e a atenção.
Também ao cantar ou dançar a criança está explorando suas capacidades além de estabelecer relações com o meio que vive.


Gustavo e sua flautinha doce: 
musicalização iniciada na escola 



A música pode, por exemplo, contribuir para que crianças muito tímidas ou com dificuldade de sociabilização, sejam inseridas e mais participativas em um grupo? 
         Sem dúvida atividades de musicalização promovem a participação, a cooperação e a comunicação além de ser um facilitador da expressão das emoções. As cantigas de roda, por exemplo,  promovem e facilitam a integração das crianças, valorizando o trabalho em equipe. As atividades musicais também estimulam o desenvolvimento da auto estima  pois auxilia a criança a ultrapassar medos e lidar com a ansiedade o que resulta no seu crescimento pessoal.


Qual a importância da música nos primeiros anos da vida escolar de uma criança? 
         A música representa uma importante fonte de estímulos e por seu caráter libertador e criador pode ser utilizado como  um importante recurso educativo. Ela sugere ações e induz a comportamentos motores e gestuais estimulando com isso a percepção da criança.
         Cantar e dançar utilizando um repertório musical de qualidade, pode proporcionar diversos benefícios garantindo um desenvolvimento saudável das crianças.


Brinquedos incentivam desde 
cedo o prazer pela música



Como são as aulas, na prática, de musicalização na educação infantil? Quais são seus propósitos e objetivos? 
         A  música é uma linguagem que se constrói a partir de vivências e reflexões orientadas. Partindo desse pressuposto, as crianças devem ter o direito de cantar, tocar instrumentos e explorar sua criatividade e imaginação.
         As aulas de musicalização compreendem a música de acolhimento, momento onde ressalto sempre os nomes das crianças, a hora do canto, que é o momento em que cantamos músicas diversas trabalhando inclusive o resgate de músicas que fazem parte da cultura infantil, ricas em produtos musicais, atividades que compreendem integração de som e movimento, desenvolvimento de atividades utilizando brincos e parlendas, jogos musicais, atividades com percussão corporal (exploração dos sons corporais), marchas, danças e cirandas, relaxamento, atividades de registro e canções de despedida.
         Todas essas atividades têm como objetivo fazer com que a criança perceba, ouça e diferencie os diversos sons através das brincadeiras, imitação e reprodução musical, explore e identifique os elementos da música, perceba, expresse sensações, sentimentos utilizando composições e interpretações musicais.


Como se dá a linguagem corporal nessas aulas? É um misto de música e dança, de reconhecimento corporal? 
         As crianças adoram se movimentar e utilizam seu corpinho para demonstrar seu estado emocional. Se estão alegres correm, pulam, brincam, mas se estão tristes encolhem-se timidamente.  Sua expressão corporal é grande reveladora do que sentem. O corpo fala, então é imprescindível que as aulas de musicalização explorem essa linguagem tão rica da infância. Durante as aulas sempre procuro propor atividades em que as crianças possam conhecer e valorizar as possibilidades expressivas de seu corpo.


A musicalização contribui também para a coordenação motora da criança?
         A música contribui e muito para desenvolver as habilidades motoras das crianças. As atividades desenvolvidas durante as aulas faz com que a criança aprenda a controlar seus músculos e mover-se com desenvoltura. O ritmo trabalhado através das canções ou mesmo ao tocar instrumentos tem um papel importante na formação e equilíbrio do sistema nervoso. O movimento adaptado a um ritmo é resultado de um conjunto de atividades coordenadas. Atividades simples como cantar fazendo gestos, dançar, bater palmas ou mesmo os pés, são vivências importantes que desenvolvem o senso rítmico e coordenação motora, fatores importantes para desenvolver o processo de aquisição da escrita e da leitura.



Cite exemplos de crianças, que apresentaram avanços social e cognitivo depois que começaram a frequentar aulas de musicalização. 
         Posso citar aqui dois casos muito interessantes. Há três anos participo de um projeto em uma escola municipal onde trabalho com alunos do 2º ano. Sou responsável pelos cursos de musicalização e iniciação musical. Uma das alunas tinha um comportamento muito tímido. Ao conversar com sua professora descobri que essa criança passava por sérios problemas familiares. A música contribuiu como um instrumento de intervenção em suas questões emocionais. Através do estudo da música essa criança passou a mudar seu comportamento, deixando sua timidez e tendo atitudes que revelavam maior segurança. Também, segundo a sua professora, tornou-se mais participativa em sala de aula e passou a interagir mais com seus colegas de classe.
         Outro caso é de um menino que possui uma síndrome que limita seus movimentos. No início das aulas ele não era participativo.  Comecei a perceber que ele expressava uma enorme alegria e euforia quando ouvia determinadas músicas. Após algum tempo comecei a oferecer instrumentos para que ele pudesse participar com seus colegas das atividades. Aos poucos ele foi interagindo com os alunos e hoje é uma criança muito participativa. Adora participar das brincadeiras musicais e todos o auxiliam nas aulas. Isso mostra como a música pode intervir nas relações sociais emocionais das pessoas.


Apresentação na escola 
com o pandeiro de brinquedo:
 música  está  sempre  presente


A partir de qual idade a música pode contribuir para o desenvolvimento de uma criança? Ela pode acalmar, por exemplo, bebês mais agitados ou ter o efeito contrário - agitar e estimular quando necessário? 
         Vou responder essa pergunta com outra: imagine uma academia de esportes onde ouvíssemos como música de fundo “Concerto para violinos”, de Brahms. Não seria muito motivador, não é mesmo? (risos)
         Ouvimos o barulho do mar, o vento soprando, o bater de martelos, o ruído dos carros, o canto dos pássaros... Perceber as vibrações sonoras que nos rodeiam é parte de nossa integração com o mundo que vivemos. Nossa escuta guia-se pelos limites impostos por nossa cultura estabelecendo uma relação direta com o nosso entorno sejam eles musicais ou não. É comprovado que as melodias reavivam nossas lembranças e provocam reações físicas como por exemplo a aceleração de nossos batimentos cardíacos, ou mesmo o arrepio de nossa pele. Comprovadamente a música tem uma grande relação com nossa afetividade. As relações de altura entre as notas musicais executadas em uma melodia, que chamamos de  altura tonal,  e o andamento, grau de velocidade aplicada à execução de um trecho musical,  determinam se essa melodia é triste ou alegre.
          A altura tonal da melodia e a variação do andamento podem ser fatores determinantes para trabalhar nossas emoções. Por essa razão temos vários tipos de melodias aplicadas para relaxamento, para estimular, para tranqüilizar.
         Sua contribuição para o desenvolvimento dos bebês é primordial. Ela pode estimular os bebês, também têm o poder de acalmá-los sem dúvida. Só temos que ter um certo cuidado ao escolhê-las pois existem alguns mitos de que a música clássica, por exemplo,  é relaxante. Dependendo da complexidade dessa música ela pode sim ativar e estimular ainda mais nosso cérebro.


Que tipo de música você acredita que os pais devem levar para suas crianças? 
         Devemos trabalhar sempre com um repertório bem variado, ampliando dessa maneira o conhecimento musical de nossos pequenos. Músicas da cultura infantil, músicas instrumentais e cantadas devem fazer parte dessa escolha.
 Gosto de trabalhar resgatando músicas tradicionais de nossa cultura, mas isso não nos impede de acrescentar também as músicas que são veiculadas pela mídia. Temos alguns trabalhos muito ricos que podem e devem ser explorados pois a diversidade musical do Brasil é imensa.
         Como dica posso citar o trabalhos da “Arca de Noé” de Toquinho e Vinícius de Moraes, Palavra Cantada, Adriana Partimpim, Música de Brinquedo (Pato Fú) que traz um arranjo instrumental muito interessantes onde são explorados os sons de alguns brinquedos, Os Saltimbancos, Adaptação da história “Os Músicos de Bremem” feita por Chico Buarque de Holanda,enfim, existe uma infinidade de cd’s disponíveis no mercado que trabalham com músicas de boa qualidade.
        
                 
Qual o nome da técnica que você aplica com as crianças (o tumtumpá! rs) e quais os seus objetivos? O que a criança aprende e quais os seus  benefícios ao colocá-la em prática? Fale um pouco sobre isso (que aliás, meus filhos amam!)
         Nosso corpo é uma rica fonte sonora e podemos explorar os diversos sons que ele produz para criar músicas.
         Essa exploração sonora é chamada de percussão corporal e consiste em explorar os sons que podemos produzir ao bater palmas, pés, estalando os dedos, ou qualquer ação que possa produzir sons.
         Essa técnica foi criada pelo músico paulistano Fernando Barba, que em 1995 criou o grupo Barbatuques.
         O repertório desse grupo musical é muito interessante para ser trabalhado nas aulas de musicalização pois mostra o resultado da coletividade e da brasilidade nas canções por eles trabalhadas.
         Tudo vira uma grande brincadeira em sala de aula e os alunos adoram descobrir que fazer música não se restringe e a ter um instrumento e executá-lo como acompanhamento das canções.
         Ao participar dessa brincadeira as crianças passam a desenvolver um amplo repertório de sons que podem ser produzidos pelo corpo, estimulando o autoconhecimento e a desenvolvendo a consciência corporal, promove a integração desses sons com ritmos e melodias, estimula a memorização e concentração, desenvolve a coordenação motora e a percepção rítmica, melódica e harmônica, tão importantes na música, e por ser uma atividade realizada em grupo, promove a socialização e integração das crianças.  


Matheus: um futuro guitarrista? Será? 



Com quantos anos, em média, é possível uma criança aprender a tocar um instrumento? E quais os instrumentos mais indicados para essa inicialização? 
         Bem, não existe uma idade ideal. É importante que a criança queira aprender. É fundamental também que ela escolha o instrumento seja feita em função  de suas preferências e gostos. Para isso as crianças podem ser matriculadas em escolas que tenham aula de iniciação musical, onde terão a possibilidade de experimentar diversos instrumentos.
Os pais devem ter a preocupação de escolher escolas que tenham profissionais e professores com experiências comprovadas com crianças pequenas, que ensinem os pequenos explorando a espontaneidade e amor pela magia dos sons e que ensinem a música transformando as aulas em uma brincadeira musical e não em uma obrigatoriedade.
          


Sobre Elaine Othero de Souza:
Arte educadora formada pelo Centro Universitário Claretiano, participei de diversos cursos e palestras sobre musicalização infantil, pois sempre tive o sonho de fazer com que as crianças desenvolvessem a mesma paixão que sempre tive pela música.
Trabalho  a 10 anos com educação musical ministrando aulas de musicalização e iniciação musical para alunos da Educação Infantil e Ensino Fundamental em instituições

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Amei a matéria e o depoimento!
    Minha família é de músicos. Também sou mamãe e meu filho Pedro é movido a música. Ela etá presente em nossas vidas,na rotina e na nossa história!
    Na escola, nas aulas de música ministradas pela professora Elaine, meu pequeno tem descoberto junto com os amigos a magia dos sons com atividades lúdicas e muito envolventes!!
    Um trabalho excelente da profissional, da escola!
    Parabéns à todos!
    Kely Rebello

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